segunda-feira, 27 de junho de 2016

Fiz os meus dias


fiz os meus dias
como quem bebe
ainda e sempre
o beijo
daqueles primeiros anos
daqueles primeiros sonhos
daquele primeiro amor

fiz os meus dias
de amores partindo
deixando o som dos passos nas calçadas
e o meu coração
em tantas vozes caladas
em tantas caladas vozes chorava

fiz os meus dias
como quem arde
imponderavelmente
nas infinitas imagens
que as memórias trazem
na forja inelutável dos dias

fiz os meus dias
o tempo passando
misterioso e mudo
enigma de tantas dores
o solene grito agudo
entre sussurros
de insondáveis amores

fiz os meus dias
o tempo passando...
passando...
passa
imerso e invisível
em sentimentos
enganos

fiz os meus dias
o tempo passando...
passa
aos poucos
ou passa em bando
passando de quando em quando
como pássaro invencível

fiz os meus dias
de um sonho que assoma
qual alvissareira fantasia
o sonho que me toma
a flor do tempo e o silêncio
farfalhando no dia a dia
sussurrando a canção
e a brisa bebe afogueada a poesia

domingo, 5 de junho de 2016

Escrevo


há palavras que não posso te dizer
há gestos que são só silêncios
e te olham
como as memórias olham o passado
e as noites, então, demoram-se
percorrendo as sombras sobre as flores
fazendo escuros os mundos
nos quais vivo sem ti
por que a poesia que tenho
é feita das palavras que não posso te dizer
escondidas em mim
desmedidas
te desejando
e sonhando nos amores todos
como seria te amar
em tanto amor pousado na tua chegada
em segredos
em ausências
na espera
respirando o teu perfume

escrevo
escrevo
escrevo
como se escrevendo cada vez mais
pudesse, enfim,
dizer-te coisas de amar
e, então,
a tua boca pousasse na minha
e todos os verbos diriam versos
e todos os versos diriam amor

nas noites insones fecho meus olhos
dou nome a ti
e canto e escuto o nome que te dei
e tremo dentro da solidão
sedenta da tua doçura
tudo é recordação
que os teus olhos põem no meu coração

às vezes me pego pensando
o que para ti eu diria
se eu pudesse
às vezes me pego pensando
o que para ti eu faria
se eu soubesse
e entrego à noite que habita em teus olhos
o nome que para ti eu sonhei
e que enche os silêncios do meu mundo
com uma canção de uma antiga voz branca e quieta
e um sol mirando o outono
a rosa entreaberta no vermelho dos teus lábios
lembrança do beijo
que não te dei
e que é o inominável das palavras
pra sempre nesta poesia
para sempre inacabada