Junto palavras como a criança que junta
palitos de picolé
armando uma construção
que ninguém vai ver
e que desfaz quando acabada
e que dos mesmos palitos inicia nova construção
Junto palavras dentro do silêncio
E o tempo aninha-se ao brinquedo
e encobre a vida,
eterno sisifismo,
e esvoaça
no seu caminho sem volta
As palavras espalham flores,
gotas d'água,
orvalhos pelas manhãs,
cantam cigarras à tardinha,
trazem de volta os passarinhos,
incendeiam o cricrilar dos grilos,
põem no céu as estrelas
e em meus olhos saudades
que às vezes parecia até cisco
que nem dava pra ver a manhã caminhando
O sol rasgando as sombras de maio
neste último dia de abril,
mastigando o friozinho da manhã,
sorve o outono e entra pela janela
acendendo as letras pretas na página toda amarela
E a palavra uma hora se revela,
outra hora foge,
inventa,
cai em contradição
Junto palavras como quem junta
nos ventos
sua vaza de solidão
Imagem: Wassil Kandinsky
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