sábado, 10 de outubro de 2015
O homem que eu nunca consegui ser
vai caminhando,
cada vez mais para longe de mim,
o homem que eu nunca consegui ser,
os sonhos que adormeceram
no mundo das idéias
nas noites de vigília e sofreguidão,
incontáveis sonhos inanimados,
perpassando a imanência da alma
deixando na minudência dos dias
a desconfortável sensação
de olhar para mim,
olhar em volta,
e não me ver
e nunca ser
e ser o outro
e ser o mesmo sempre ser
em tanto tempo consumido
deixando a lágrima como forma
inominada e infinita das quimeras que grassam
sendo os dias claros e sem segredos
sendo as noites dos escuros mais profundos
dentro dos mais sustidos medos
dentro dos mais longínquos mundos
que afloram em mim
pássaros voando ausências
e memórias do não ter sido
reminiscências de vidas que não vivi
partes de mim,
cisma e mistério
atravessando os segundos
sendo que os olhos que tenho
divergem e devoram as imagens que contemplam
são estes olhos que por vezes olham inertes
para o que ainda não tem nome
ou cujo o nome se perdeu
quando a primavera debandou os pássaros
ou os gestos intangíveis lhes consumiram
e, no entanto, ainda inunda a alma de comoção
e de estesia
o homem que nunca consegui ser
era muitos
o tempo passando era vário,
a solidão invisível,
indizível
e as lágrimas do homem que eu nunca consegui ser
eram muitas e prolongadas
e com o tempo vão secando no rosto
do menino medroso que sempre fui
maduras, convulsas, desesperadas
Imagem: Ramiro Ramirez Ramirez
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