segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Vem de onde?


Vem de onde
esta escuridão amara que sufoca
e pára as horas?
Este medo
dos medos que não tremem
e que não fogem?
Esta fera que me espreita
e assoma entre as imagens do espelho?
Este golpe seco, intermitente
que me atinge e que me acorda
em meio às purpúreas madrugadas?
Esta angústia
fatigante do passado que não se cala,
                                               e geme
                                         e desespera
nesta noite estendendo-se sobre os telhados
pisando as tristezas das ruas
apreendendo-se nas minhas mãos prisioneiras
destes gestos tão antigos,
esperando
os pássaros retornarem aos ninhos
e aos galhos sonolentos
desprendendo
sombras amarelas
sobre os olhos ondulantes dos lagos

Vem de onde
este canto
que se existiu,
já não existe?
Esta lua
oblíqua e negra derramada nestes ventos?
E a ausência inconcebível deste mar?
Vem da onde esta voz de sons tão cálidos
esta melodia de ilusão
que canta nesta noite
aprendendo a ser noite em teu olhar?

Vem de onde
esta ilusão em que vivo
neste inacabado
de mundos dentro de mundos?
Estes passos inseguros
caminhando as distâncias das quais falam os ventos
que me levam pelos céus manchados de travessia
onde o ar
encrespa as águas,
tilinta,
esquece e asfixia
onde a palavra primordial estremece
e se expande
como poente e moradia
da luz do sol depositada
na paisagem ao redor do fim do dia?

Imagem: Christian Schloe

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