sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Metades da primavera


Eu e você...
abandonos e carinhos
gestos sem passado
as roupas nuas sem amanhãs
teus olhos negros erguendo o dia
teus lábios frescos e inocentes aspergindo as palavras
ninando o dia
a tangível fantasia
brincando
com a infância acordada em nossos corpos
brincando com o poema
que nós éramos (que nós somos e seremos)
e com a eternidade vivendo em nossos poucos anos
em toda as coisas
que nas flores da lembrança ainda eclodem ou se inventam
e nos botões que florindo ainda virão
no gesto que ficou e que ainda guarda o afeto
e no teu jeito sem jeito de olhar para o segredo
dos nossos corpos despidos
o teu jeito de se ajeitar sobre as letras e as palavras
e aconchegar-se em meu colo como
se no mundo não houvesse o medo e o desamor

ficamos, meu amor, tu e eu, cada um
com metade da primavera
e, então, a primavera só se completava e acontecia
quando nos encontrávamos e bebíamos o amor aos goles,
ávidos um da metade do outro
na minha mão a tua mão
e os nossos sonhos entreabertos
e a ingenuidade dos nossos brinquedos secretos
sem promessas presas às nossas bocas
mansamente chamando pelas aves que voavam
e levavam a dizer palavras
anunciando a ternura do gozo impressentido
e a poesia balbuciada
nas tardes amadurecidas
nas cinzas do calor dos nossos braços
entre abraços
envolvendo a gente e o dia
dentro da mais estonteante alegria

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