quinta-feira, 30 de julho de 2015

Lava jato


Diz a aclamada sabedoria popular que
em tempos de lava jato
como em tantos outros "escândalos"
quem paga o pato é o povo
Será?

Somos o pato e o povo
o povo amnésico
o pato apoplético
doente
demente
crente
que esquecemos o passado tão de repente
e o mesmo trambique de ontem hoje nos parece novo

Somos aquele povo que se diz tão esperto
que se tem trambicagem se não estivermos envolvidos,
pelo menos estamos por perto
o povo pato
o povo rato
o povo sem eira nem beira
servindo-se da xepa da feira
o povo avestruz
que engole a vida sem mastigar
que na hora do pega pra capar
procura o primeiro buraco para a cabeça enfiar
que pensa que sabe pensar
e, sejamos justos, chegamos até mesmo a pensar
porém sem nenhuma clareza
quando nos danamos a pensar é só tramóia e safadeza
que vantagem vamos tirar

Somos o pato povo
deitado em berço esplêndido
rangendo os dentes
entre um talagaço e outro
num assomo de austera
e auto-decantada malandragem
rangendo os dentes
sem nunca morder quem nos submete
Não reclamamos nem protestamos em alto e bom som
provavelmente para não acordar a ira dos poderosos
só resmungamos
desembestamos a resmungar num solilóquio tacanho e vão
do "escândalo" do momento
não atinamos com as seculares mazelas
fáusticas e arraigadas no caráter nacional
ou, melhor dizendo, na falta de caráter nacional
choramingamos pelos cantos
nas rodas de amigos
que só resmungam também
dizendo
amém
amém
amém

Somos uma gente opilada
tapada
tartamudeando inerte
o sempre mesmo ramerrão
sempre a mesma ladainha
que a vida seria boa
não fosse o político ladrão
não fosse a política mesquinha
não fosse Vossas Excrescências (Eleitas por nós, diga-se de passagem)
não fosse o papa a rainha
não fosse o outro gatuno
não fosse o outro o que é
tudo de ruim é o outro
numa auto-crítica chulé
esquizofrênica
que nos exila da bancarrota moral do país
cada um se acha o mais correto
o mais apto a meter o dedo na cara do descalabro
panteão da honestidade
baluarte da moralidade
gente tão ilibada assim por aqui nunca se viu

Vassalos, a maioria, da lei do menor esforço
da lei de Gerson
do jeitinho canalha a tão brasileiro
este jeitinho brejeiro que ri insanamente de tudo
este jeitinho que sepulta a vida com uma grande pá de cal e piadas
onde todo dia é dia 1º de abril

Acomodados
braços cruzados
esperando...
esperando sentados pra não cansar
esperando que um Cristo enxovalhado e morto
pela voz e a decisão de um povo que bem poderia ser como nós
que bate no peito e se diz temente
católico apostólico
fervoroso crente
de bíblia na mão
e o cramunhão na mente e no coração
e que hoje range os dentes
destilando fel
jogando merda ao vento
esperando que um Cristo
venha nos tirar deste profundo desalento

Somos um povo dissimulado e hipócrita
que passa pela vida sem atinar
por sublime, preguiçosa e crassa ignorância
ou por leviana conveniência
que a vida é um grande espelho
onde a imagem que nós vemos não é a do outro que nos fita
é a nossa própria imagem vista pelos nossos olhos
convenientemente esquizofrênicos
buscando elidir de nós o mesmo comportamento sacana
que no outro salta aos olhos
agora sem esquizofrenia
e para o qual faltam bocas para acusar
Somos um povo que vive de proclamar as vilezas do mundo
como quem não tem nada a ver com isto
Um povo que de tão desatento
ainda hoje entre Jesus e os ladrões
crucificam o tal de Cristo
e depois ficam esperando que um Jesus vilipendiado
pela (falta de) memória de um povo igual ao nosso do brasilsão varonil
"malandro", cambaio e servil
desça da cruz
e sub-repticiamente resolva nossos problemas
e ainda vá tirar satisfação com nossos detratores

Neste arruado de espertos
tão farto de salafrários
onde o que falta é otário
em cada esquina nos espera
algum conto do vigário

Somos um povinho que se proclama "esperto"!!!
que olha a vida com olhos gastos
e de soslaio
que diante dos "poderosos" abaixa a cabeça
e põe os olhos no chão
cegos e perplexos
enfiamos o rabo entre as pernas
submissos como o mais obediente dos cães
com uma enigmática ojeriza para pensar nossos problemas
sem atentar para os caminhos
luzindo de tão óbvios
Sem sequer cogitarmos a possibilidade
de acender a luz para sair da escuridão
Mancomunados com a apatia
e com uma cômoda inércia inata
quedamo-nos moucos e calados
à gargalhada sarcástica e impiedosa
dos eternos e inextinguíveis senhores feudais
(sempre atuais graças a nossa pasmaceira geral)
diante do nosso gemido estudado
falso e supliciado

Grande parte de nós tende a serem mudos vassalos
servos submissos
lacaios empedernidos
sórdidos
embriagados pelas aparências
de uma mansuetude e obediência canina
com suas almas ausentes
trôpegos de tanta vileza
fingindo asco
e lambendo os testículos daqueles
que os põem a andar de quatro
nus de si mesmos
e sem dignidade

Somos um povo sem memória
e sem moral
um povo, de fato, morto
que se esqueceu de deitar
que dormiu dentro do ônibus
e só acordou no ponto final


Enquanto isto, uma voz de arquibancada ecoa em tom de verde e amarelo:

Ah! Eu,
Sou brasileiro
Com muito orgulho
Com muito amor...ôôô

Moral da musiquinha infame:
Quem canta seus males espanta

Comentário da moral da musiquinha:
E mantêm-se néscio, distraído e com espírito ovino

PS: Onde lê-se "Nós", entenda-se a grande maioria da população
       A generalização seria leviana.

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