terça-feira, 11 de agosto de 2015

O filho da puta e o senador


Sob o estigma de "supostos" desvios e falcatruas
Vossa Excelência se dirige ao palanque
A vida,
de repente,
malbaratada e enxovalhada novamente
Nas mãos a malícia de um discurso tantas vezes lido
torcido, distorcido, retorcido e repisado
Um jogo de gato e rato jogado todos os dias

Inicia sua defesa
A voz calma e pausada
Se culpa havia na entonação desaparecia
Desaparecia nas entranhas arcaicas
e na amnésia providencial da política
As rusgas e anomalias prosaicas da retórica pedem
a saliva afogada das palavras inescrutáveis
No gesto e no tom a admoestação e o protesto à vil perseguição
Negações
Evasivas
Fugas
Alienações
Juízo de valores
Valores sem juízo
Faz-se urgente tirar a pedra amarrada aos pés
quando o corpo já pressagia o fundo onde a lama o espera
Emparedado
busca nas coxias do teatro político
decadente e velhaco,
as personagens ressentidas
que darão vida e voz ao discurso
que os dentes tantas vezes mastigaram
como se mastiga o adversário
e entregaram à boca articulada do boneco do ventríloquo

Diz da sua vida ilibada
Da compatibilidade de renda e de bens
Da intriga sórdida e pusilânime
Do seu vigor intemente diante da injustiça
Da incandescência luminar da sua pessoa
Da vida que se pretende jogar ao chão à toa
Ficam subtendidos
a humilhação
o soco
o choque
a delação

As palavras pungentes borbotam
distraídas e insontes como o silêncio
que estimula a voracidade do rato
e impele sua coragem
em direção ao queijo na ratoeira
antes do baque surdo da ratoeira a lhe pegar
Palavras recortadas aqui e ali pela ira contida e dissimulada
que se encontra amordaçada em cada homem

Em seu ninho a serpente vocifera e chacoalha o guizo de anéis

De repente
a ira aferrolhada entre grades complacentes
deixa escapar entre dentes
numa outra voz mais humana, mais insondável
o murmúrio
o sussurro
dito para o vazio ali parado sobre o momento
diz, somente para os átomos do corpo,
de si para si,
mordazmente,
o que pensa do procurador que o acusa:

"Filho da puta"

A frase, grito invertido,
perversa,
escorre, escapa e foge
assim como quem solta um punzinho
achando que ninguém vai ouvir
e o "punzinho" se rebela virando sonora proclamação

No Senado Federal,
"casa do povo"
onde o povo não se atreve a entrar
só olha de fora
cabeça baixa e calado
no máximo a petulância de resmungar, resmungar...
o axioma moral pende solenemente dos lábios
operísticos do preclaro senador
como um resmungo sonâmbulo
e deixa-se ficar no silêncio ilibado da sessão

Da verdade pouco ou nada resta
O rio seguirá seu curso e as margens o coagirão
seja ele um rio de planalto ou de planície
que seca na seca ou perene de aluvião

O procurador que procure na genealogia familiar
e perquira nas atividades laborativas de sua genitora
a confirmação ou não do aventado
ou se o impropério veio da danação
de um homem acossado e supostamente aviltado
em sua honra, em suas dúvidas em suas dívidas sociais

Com palavra pomos flores e perfumes na pocilga que é este país varonil
e em momentos de ira incontrolável ou conveniente
desembestamos a colocar putas e luzes vermelhas pelos lares do Brasil

Senhor Senador,
Por mais palavras que usemos
Por mais que os passos escamoteiem por onde fomos,
de onde viemos
A consciência nos diz com fragor aquilo que somos
A máscara rasgada e combalida ainda é máscara também
Senhor Senador.
Vossa Excelência foge do que ou de quem?

A natureza é concisa
mata e morre
quando deve matar ou morrer
e não se equivoca
onde deve por o ponto final.

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