sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Quando a gente vê... a gente já deu

 
ele chega
com voz de cama desfeita
com sua lábia de mascate do sexo
cachorro seguindo cio
trazendo no sussurro o grito
de êxtase
pegando na mão dela
o que diz roçando o infinito
mordiscando os bicos dos seios
dizendo coisas tão quentes
prementes
as palavras pubescentes
acordando palavras dormentes
promessas de gozo e arquejo
a mente e o espírito dizendo não
a pele dizendo sim
querendo ir até o fim

a cama guardada para o amor verdadeiro
para uma amor companheiro
já não enxerga o pecado
carola, da boca pra fora
promessas de inferno
e de danação
mundos inteiros de aflição
os peitos, a vulva, a bunda...
que sejam tocados e fiquem imundos
até a próxima confissão
a coerência e a fé esquecidas
esfregando-se ao Divino Espírito Santo
tudo apagando-se em errantes promessas
vazias de sentido e conteúdo
as tessituras do corpo cedendo ao desejo
quebranto
sonhos pueris
moleza
um sem sentido

a vontade,
lânguida e luxuriosa,
já deitando entre moitas,
se encostando aos muros,
roçando em lentos segredos
esfregando-se na penumbra
fraca e manca

a calcinha
molhadinha de suspiros
deslizando dissolvida
descendo
em arrepios incontida
os flancos à mostra
a vida fugindo da vida
a língua molhando a saliva
o clitóris arquejando ais indefesos
esquecendo de tudo que ela se promete
para entregar-se ao momento sem memória

ele diz as coisas que ela quer ouvir
mesmo que sejam
sortilégios
meias verdades
mentiras inteiras
ditas com suavidade e malícia
com gosto de gozo e delicia

morrendo serena e consentidamente
quem já não morreu?

ele pede sem dizer
despetalando cada pétala do seu intento
lenta e carinhosamente
o mundo se derrete e escorrega
por entre as pernas febris
mudo orgasmo
o mundo,
antes esférica prisão aos céus
e aos santos atada
dos céus e dos santos já se esqueceu
e diz,
o gesto nu e pequeno saindo da cama
entre o prazer e o pecado:
quando a gente vê, a gente já deu

Imagem: Christian Schloe

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